Após ser desafiado por um grande presságio, um jovem herói embarca numa incessante busca pelo seu próprio passado, navegando por constantes devaneios sobre a vida cosmopolita, o significado da arte, as amizades distantes e a inevitável passagem do tempo.
A minha sinopse começa então com algo ligeiramente enganador. A noção de presságio é um tema recorrente no romance, assim como nas histórias antigas das quais admito beber inspiração. Acontece que, ou há uma ambiguidade sobre o que é o tal grande presságio, ou a linha temporal na qual a ação decorre não é meramente linear. Pois o meu protagonista embarca numa busca pelo seu próprio passado ainda antes que lhe aconteça qualquer presságio. Mas talvez esta minha explicação confusa não seja mais do que uma coisa de semântica. A verdade é que considero que há de facto um presságio, um chamamento simbólico ao qual o protagonista tem de responder, e cujo desafio incumbente ele tem de superar para chegar ao fim do romance, acompanhado, espero eu, do leitor atento. Mas se a linha temporal não é linear, então qual é o fim do romance?
Quanto à ideia de busca é expediente acrescentar um apontamento. É uma ideia que tem ecos claros de Proust, ecos que eu também não fiz grande questão de esconder. Porque eu ergo-me nos ombros de gigantes, digo eu, parafraseando Isaac Newton. Aliás, foi justamente com a descoberta de Em Busca do Tempo Perdido que me apercebi de como desenvolver o meu romance, Proust foi justamente a peça que me faltava para conseguir finalmente alongar a minha prosa com as qualidades carentes aos devaneios do meu protagonista. Numa palavra, foi com Proust que aprendi a escrever um livro onde não acontece nada. Claro está que isso é uma simplificação, é um coloquialismo. Na verdade acontece muito, senão eu teria apagado parágrafos inteiros, mas é preciso aceitar a premissa do livro, é preciso render-se ao ritmo da narrativa e deixar que a história aconteça. Se os meus eventuais leitores gostarem das minhas personagens, penso que hão de apreciar também os seus devaneios e hão de se aperceber de que cada um deles tem um propósito. E então surge a pergunta – para onde foi o passado do protagonista? Essa é uma pergunta à qual nem eu sei se sei a resposta. Costuma-se dizer que escrever sobre a saudade é uma coisa tão portuguesa e eu não hei de ser exceção, até porque sou português. Sorry to disappoint.
E os vários objetos do pensamento do protagonista, qual é a natureza deles? A vida cosmopolita, porque sempre o rodeia, é-lhe inevitável, tal como a passagem do tempo. É o mundo em constante movimento que ele habita, um movimento cuja existência exige toda uma série de questões que mais ninguém parece sequer considerar. De onde vem aquela força que todos os cidadãos têm de acordar para o mundo e fazer parte dele? De onde vem a confiança com que cada estranho sai de casa todas as manhãs e sente-se em casa pelo mundo fora? De onde vem o significado com que todos eles cumprem até as ações mais insignificantes? Tudo detalhes de algo ironicamente invejável ao meu protagonista desnorteado, tanto na vida como na arte. E se até nos mais simples trabalhos e ocupações dos vários cidadãos, como os operários, os empregados de cafés e restaurantes, as funcionárias administrativas, os seguranças e guardas... se até todos esses esforços lhe parecem em vão, então qual é que pode ser o valor da arte? A sua grande vontade é de não fazer nada e ele quase que se perde precisamente nisso, até que uma visita inesperada lhe traz uma mudança de planos. E é assim que ele embarca numa viagem durante a qual ele é a cada momento relembrado de um qualquer detalhe do seu passado, que por sua vez lhe chega numa maré de memórias. Mas o tempo não espera, o tempo escasseia.
E o que mais é que posso dizer? Posso dizer que este livro é-me mais íntimo do que o primeiro. Quer dizer, o meu primeiro livro também é íntimo, muito mais do que possa parecer, e não consigo imaginar escrita que não seja íntima. Uma vez encontrei uma lista de compras abandonada no fundo de uma arca congeladora num supermercado, li-a e examinei a caligrafia como se aquela folha rasgada a um bloco de notas fosse um papiro da antiguidade. Não sei porque é que isso me ocorreu agora. Idiossincrasias da memória, que se há de fazer... Reitero então que este livro é mais íntimo e pessoal, este livro está escrito na minha língua materna, e quem o porventura ler, será provavelmente alguém mais próximo de mim, tal como as minhas personagens são mais próximas do meu protagonista. E se a memória e a saudade são mesmo características portuguesas, então não falta dizer nada exceto isto – espero que gostes.
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