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A Minha Interpretação Pessoal de “A Palidez do Dia” de Ricardo Reis

Este poema também foi fácil de escolher, mas não necessariamente pela beleza dos versos em si. Desta vez escolhi-o simplesmente porque a terceira estrofe trouxe-me um momento proustiano, ressuscitou-me uma memória há muito perdida mas nunca completamente esquecida. E como além de meramente escrever aquilo que me vai na cabeça também ocasionalmente escrevo para relembrar, posso dizer que a missão foi cumprida. Na verdade toda a poesia de Fernando Pessoa, e talvez toda a poesia em geral, funciona um bocadinho assim, ou seja, é muito fácil esquecer os versos, mas sempre que regressamos a eles, até mesmo vários anos depois, somos relembrados de tudo imediatamente, num só momento que enche uma fração de segundo com mais memórias do que cabem em dez anos... Quanto a mim não passaram dez anos desde a última vez que visitei este poema, mas por acaso passaram sete. Isso até custa dizer, custa acreditar que passou assim tanto tempo... Escrevi dez na frase anterior só por soar bem usar um número...

A Minha Interpretação Pessoal de “Saí do Comboio” de Álvaro de Campos

Este poema, tal como o anterior que escrevi da autoria deste mesmo poeta, foi dos mais fáceis de escolher. E isso fez-me chegar a duas conclusões – a primeira é de que este heterónimo é, pelo menos a meu ver e pelo menos agora, o melhor de todos, e a segunda é de que ele é o mais próximo do próprio Fernando Pessoa, talvez às vezes é até quase que indistinguível. Custa-me acreditar que versos como estes estejam distanciados do homem real por uma personalidade inteira, ou que essa personalidade seja tão completamente fraturada da realidade. Na verdade às vezes ignoro ligeiramente a questão da heteronímia, reduzindo-a à indecisão filosófica do poeta, mas não considero essa redução num sentido de todo pejorativo. O que acho que estou a tentar dizer é que quando Álvaro de Campos entra na sua fase decadentista faz-me sempre lembrar as melhores páginas do Livro do Desassossego, até a ponto de me fazer confundir os versos de um com as páginas do outro. E quanto a este poema, que escolhi preci...

A Minha Interpretação Pessoal de “As Bolas de Sabão” de Alberto Caeiro

Naquilo que me parece agora há muito tempo atrás, porque infelizmente foi mesmo há muito tempo atrás, eu trazia algures comigo a imagem de bolas de sabão, certamente roubada a Fernando Pessoa mas não me lembro a que poema ou heterónimo. Não sei bem porquê mas é uma imagem que se provou recorrente em vários textos que escrevi nesse tempo cada vez mais distante do meu primeiro ano de universidade, alguns textos que guardei e outros dos quais me desfiz, e ainda bem. Só que penso que muitas vezes tentei capturar essa imagem das bolas de sabão em tons um pouco feios e desagradáveis, exceto talvez numa só ocasião... Foi uma tarde de janeiro em que, depois do exame final de filosofia antiga, no qual me esqueci de referir diretamente o método socrático, sentei-me na paragem do autocarro, tirei o meu caderno para escrever qualquer coisa, olhei para o céu e encontrei-o numa mistura de laranja e púrpura, cheio de nuvens em forma de ovelhas que me fizeram pensar num guardador de rebanhos, e lemb...

A Minha Interpretação Pessoal de “Não sei se é sonho, se realidade” de Fernando Pessoa

Há sensivelmente um ano atrás ocorreu-me que não estava a escrever muito em português, e portanto decidi escrever uma série de cinco artigos consecutivos sobre o Fernando Pessoa e os seus respetivos heterónimos. E hoje, porque o tempo é um círculo e porque sempre me foi curiosamente confortável repetir os mesmos padrões quando a saudade fazia com que a ideia me passasse pela cabeça, decidi fazer precisamente o mesmo. É muito como um constante vasculhar pela memória, até porque em recordação dela os momentos maus, pelo menos às vezes, desaparecem, e relembrar os bons velhos dias torna-se uma meditação, ou um vício, ou talvez um sonho triste...  Seja o que for, é algo que perseguimos, ou que pelo menos eu persigo, e o tempo torna-se-me como que um lugar do qual tenho tantas saudades e ao qual quero regressar, por muito impossível que isso seja, para sempre. Só que o mais engraçado é que isso às vezes nem parece assim tão impossível, às vezes parece mesmo que a saudade existe tão rea...

Meditações sobre “Em Busca do Tempo Perdido V – A Prisioneira”

Estou agora perto do fim, tanto da obra em si como desta série de ensaios que eu, nas minhas tentativas de compreender e apreciar Em Busca do Tempo Perdido, tenho escrito. Comecei no verão passado, tendo planos de finalizar a obra inteira justamente no verão seguinte, que é este aqui e agora. Ainda vou muito a tempo mas é curioso que, tanto quanto sei, sempre me atrasei na leitura de cada volume. Às vezes lia cinquenta páginas seguidas e a bom ritmo, mas outras vezes passava dias sem sequer ter vontade de abrir o livro. Sempre me foi assim mas por outro lado sempre consegui terminar o ensaio respetivo a cada volume no seu devido tempo, sendo que o derradeiro será algures no final deste verão. E se insisto sobre a importância do verão é porque ele é importante para mim. Para Proust também parece ser mas não faço questão de fazer misturas ou de oferecer objetividade com as minhas interpretações, pelo menos não como objetivo principal. O que mais quero com tudo isto é, muito sinceramente...